Mãe desabafa após condenação de “Baiano”, que recebeu 27 anos e 8 meses por feminicídio brutal no Maranhão.
MARANHÃOZINHO - A mãe de Ana Caroline Sousa Campelo, morta em dezembro de 2023 no Maranhão, descreveu como “difícil” e ao mesmo tempo “aliviador” acompanhar o julgamento do homem condenado pelo crime. A jovem foi assassinada com extrema violência e teve a pele do rosto, o couro cabeludo e os olhos arrancados.
Nessa quarta-feira (5), em Governador Nunes Freire, Carmelita Silva Sousa acompanhou o julgamento de Elizeu Carvalho de Castro, conhecido como “Baiano”, condenado a 27 anos e oito meses de prisão pelo feminicídio de sua filha.
“Foi difícil, muito difícil estar naquele tribunal, sabendo que a gente ia ficar cara a cara com um bandido, que foi assassino de uma pessoa que a gente ama”, disse Carmelita.
Apesar de a pena não ser a máxima prevista, a mãe disse que a decisão trouxe uma sensação de justiça.
“Foi muita aflição, muito nervosismo, mas a sensação de justiça a gente teve. A família ficou ansiosa, esperando o resultado. 27 anos e 8 meses não é a pena máxima, não era o que a gente esperava, mas a gente teve que aceitar. A justiça por Carol foi feita”, afirmou.
“Nada vai apagar as lembranças que tenho dela”
Emocionada, Carmelita lembrou da rotina com a filha:
“As lembranças dela vão ficar guardadas no meu coração. Quando chegava dizendo ‘Mãe, cheguei’, quando me ligava para saber como eu estava, quando vinha comemorar meu aniversário… Nada disso vai ser apagado da minha vida.”
Para a mãe, a condenação é resultado, também, da mobilização popular:
“Eu lutarei sempre por ela. Graças ao mundo inteiro que se mobilizou, ele foi levado a júri e condenado pelo que fez. Eu estou feliz por esse júri ter acontecido.”
O julgamento
Elizeu Carvalho de Castro, conhecido como “Baiano”, foi condenado a 27 anos e oito meses de prisão pelo feminicídio de Ana Caroline. O julgamento ocorreu nessa quarta-feira (5), em Governador Nunes Freire, e durou mais de 14 horas, das 8h às 22h30.
O crime, ocorrido em dezembro de 2023, foi marcado por extrema violência. Segundo a denúncia, o réu arrancou a pele do rosto, os olhos, as orelhas e parte do couro cabeludo da vítima. Imagens de câmeras de segurança mostram Ana Caroline voltando do trabalho de bicicleta quando passou a ser perseguida por um homem em uma motocicleta, identificado como Elizeu.
O acusado confirmou à polícia que era o homem pilotando a moto nas gravações, mas negou envolvimento no assassinato. Para o Ministério Público, a motivação foi o fato de Ana ser mulher, caracterizando o crime como feminicídio, tese acolhida pelo Conselho de Sentença.
Nenhuma testemunha de defesa compareceu ao júri. O juiz Bruno Chaves de Oliveira classificou a culpabilidade como “elevadíssima” e descreveu o réu como alguém de “personalidade fria, cruel e desprovida de empatia”. Elizeu não poderá recorrer em liberdade.
Em depoimento à polícia, ele confirmou ser a mesma pessoa que aparece nas filmagens, pilotando a moto, mas negou ter cometido o crime e seguiu em silêncio.
Caso Ana Caroline: morte por asfixia e meio cruel
De acordo com a denúncia, Ana Caroline teria sido morta com emprego de asfixia e meio cruel, mediante recurso que dificultou a defesa da vítima. Imagens de câmeras mostram a jovem voltando do trabalho em uma bicicleta, quando teria sido seguida por “Baiano”, que estava em uma motocicleta.
A poucos metros de casa, ainda de acordo com a denúncia, ela foi abordada pelo homem, que teria obrigado Ana Caroline a subir na moto, levando-a até uma estrada vicinal em direção ao povoado Cachimbo, localidade da zona rural de Maranhãozinho.
Conforme o inquérito, ao chegarem ao local, o homem teria asfixiado a estudante. Em seguida, o acusado arrancou a pele do rosto, olhos, orelhas e parte do couro cabeludo de Ana Caroline. Após a prática do crime, o denunciado teria abandonado a jovem no local e fugido.
O corpo de Ana Caroline foi encontrado por familiares próximo à Rua Getúlio Vargas, a cerca de 300 metros da rua onde ela teria virado com sua bicicleta. Os parentes encontraram primeiro sua bicicleta antes de achar seu corpo.
Justiça condena "Baiano" por crime brutal em Maranhãozinho. (Foto: Divulgação)
Em depoimento à polícia, ele confirmou ser a mesma pessoa que aparece nas filmagens, pilotando a moto, mas negou ter cometido o crime e seguiu em silêncio. O Ministério Público, representado pelos promotores de Justiça Rita de Cássia Pereira Souza, Felipe Boghossian Soares da Rocha e André Charles Alcântara, entendeu que a motivação do crime estaria relacionada à condição de sexo feminino da vítima, configurando feminicídio.
Na sentença, o magistrado destacou que a culpabilidade foi elevadíssima, considerando a brutalidade empregada e a desfiguração completa do rosto da vítima, o que demonstra “um dolo intenso e uma reprovabilidade que transcende o tipo penal básico”. O juiz ressaltou ainda que, embora o réu fosse primário e sem antecedentes, revelou personalidade fria, cruel e desprovida de empatia, bem como agiu com total menosprezo à vida humana.
Sem direito a recorrer em liberdade
O juiz também indeferiu o direito de recorrer em liberdade:
“Nego o direito de o réu apelar em liberdade, mantendo a prisão preventiva do acusado, por estarem presentes os requisitos autorizadores da medida cautelar, e agora, com a condenação pelo Conselho de Sentença, confirmando os indícios de autoria e materialidade, e com a fixação de regime inicial fechado, a manutenção da segregação se mostra indispensável para garantia da ordem pública e aplicação da lei penal. (...) Ademais, o acusado permaneceu preso durante toda a instrução processual, não havendo razão para que seja posto em liberdade após a condenação, considerando ainda o que restou fixado na Tese do Tema 1068 do Supremo Tribunal Federal, que diz que a soberania dos veredictos do Tribunal do Júri autoriza a imediata execução de condenação imposta pelo corpo de jurados, independentemente do total da pena aplicada.”
Em julho, o júri havia sido adiado até a nova data nessa quarta (5). Eram esperadas cinco testemunhas de acusação, além de depoimentos da defesa. “Não tá sendo fácil não. Tem dia que eu penso que ela não foi, não saiu da gente, penso que ela viajou”, disse, em entrevista à TV Mirante, Carmelita Silva Sousa, mãe da vítima.
Luto para criar o tipo penal ‘lesbocídio’
Advogada da família e assistente de acusação do MP, Luanna Lago afirmou que o caso de Ana Caroline se tratou de um crime de ódio cometido contra uma mulher lésbica, o que é chamado de lesbocídio.
Ainda de acordo com ela, o fato de o réu passar por um júri popular (quando a pessoa é julgada por outros cidadãos em vez de um juiz de carreira) pode ser representativo a depender da decisão que envolva o caso de Carol, como Carmelita a chamava.
"Quando essas pessoas compreendem a dinâmica do crime, a gravidade da situação e condenam esse indivíduo, a gente conclui que o povo não aceita mais que as mulheres, que as pessoas lésbicas sejam desumanizadas, sejam tratadas de forma monstruosa", afirma.
Segundo ela, uma eventual condenação fortalece a luta para que o lesbocídio vire um tipo penal, processo similar ao que ocorreu com o feminicídio. Caso a proposta avance, seria um crime agravado da mesma forma que um assassinato de mulheres é enquadrado desta maneira.
"É importante trazer essa visibilidade, mostrar porque nós existimos, que esses casos estão acontecendo aqui", afirma Ana a ativista Maria Esteves, integrante do Coletiva Lesbo Amazônidas, que critica a invisibilidade de crimes de ódio praticados contra mulheres que se relacionam com mulheres
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