Citando o caso da menina de 11 anos impedida de fazer aborto após estupro em Santa Catarina, o presidente Jair Bolsonaro (PL) criticou o procedimento. "Um bebê de sete meses de gestação, não se discute a forma que ele foi gerado, se está amparada ou não pela lei", escreveu Bolsonaro no Twitter.
O aborto legal é autorizado no Brasil em três situações: quando a gestação é decorrente de estupro, quando oferece risco de vida à gestante e em caso de anencefalia do feto —essa última adicionada pelo STF (Supremo Tribunal Federal) em 2012.
Um bebê de SETE MESES de gestação, não se discute a forma que ele foi gerado, se está amparada ou não pela lei. É inadmissível falar em tirar a vida desse ser indefeso!
-- Jair M. Bolsonaro (@jairbolsonaro) June 24, 2022
Em outra sequência de tweets, o presidente disse que "tanto ela quanto o bebê foram vítimas" e que "não deveriam pagar pelo que não são culpadas". Segundo Bolsonaro, apesar de ser "um caso sensível", o aborto "só agrava ainda mais esta tragédia".
- Sabemos tratar-se de um caso sensível, mas tirar uma vida inocente, além de atentar contra o direito fundamental de todo ser humano, não cura feridas nem faz justiça contra ninguém, pelo contrário, o aborto só agrava ainda mais esta tragédia! Sempre existirão outros caminhos!
A postura da juíza teve grande repercussão. Segundo juristas ouvidas por Universa, não há amparo legal para o posicionamento do hospital nem da juíza.
"O Código Penal não cita um prazo para a realização do aborto legal nos casos previstos em lei. Não fala em semanas. Isso não existe. Essas interpretações são invenções de instituições médicas. Qualquer mulher que passou por um estupro tem esse direito", diz a advogada criminalista Tania Maria de Oliveira, coordenação executiva da ABJD (Associação Brasileira de Juristas pela Democracia).
Bolsonaro usa caso de menina para atacar Lula
Essa não foi a primeira vez que o presidente falou no caso. Hoje, Bolsonaro usou a história para atacar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e declarou ainda que não pretende agir "fora das quatro linhas" - ou seja, em desrespeito à Constituição - para atender demandas de setores que o apoiam.
Mas o episódio que gerou indignação no país, chegou ao fim hoje. O MPF (Ministério Público Federal) confirmou, no começo da tarde, que o procedimento de interrupção de gestação foi realizado na menina de 11 anos. O aborto foi realizado na noite de quarta-feira (22), no mesmo hospital que, anteriormente, se negou a fazer o primeiro atendimento.
"(...) Quem quer impor uma ditadura no Brasil não sou eu [em referência a Lula]. É quem não quer a liberdade de expressão, quem vai controlar a mídia, quem vai valorizar o MST [Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra], quem diz que esse caso da menina grávida aí de sete meses tem que abortar... É quem diz que tem que voltar a emprestar dinheiro para ditaduras. É quem quer relativizar a propriedade privada."
"Ou a gente vive embaixo de leis, Constituição etc... Ou a gente vai para o vale-tudo. Hoje pode ser bacana uma medida minha fora das quatro linhas para muita gente. E amanhã? Eu posso [fazer] outra fora das quatro linhas, e o pessoal vai ficar revoltado comigo... Aí vira uma ditadura", disse o presidente.
Entenda o caso
A juíza Joana Ribeiro Zimmer, da Justiça estadual de Santa Catarina, induziu, em audiência, a menina de 11 anos, vítima de estupro, a desistir de fazer um aborto legal. A história foi revelada na segunda-feira (20), em reportagem publicada pelo The Intercept Brasil e pelo Portal Catarinas.
Segundo a reportagem, a menina, acompanhada da mãe, procurou o serviço médico do Hospital Universitário Professor Polydoro Ernani de São Thiago, ligado à UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina), para realizar o aborto com 22 semanas e dois dias. As normas do hospital permitiriam o procedimento até a 20ª semana de gestação e exigiram uma autorização judicial —ambas as normas não estão contempladas na lei.
Ao procurar a Justiça, tanto o aborto foi negado como a menina foi afastada da família e colocada em um abrigo, fazendo com que o procedimento não fosse realizado. Na audiência, Zimmer afirma que o aborto após esse prazo "seria uma autorização para homicídio". Perguntou, ainda, se a garota poderia "esperar um pouquinho" antes de abortar. O estupro ocorreu quando a vítima tinha dez anos.